Cancro: o elefante na sala

Nem sempre é fácil falar sobre doenças – mas é necessário. Quanto mais informação tivermos, melhores decisões podemos tomar, sobretudo numa lógica de prevenção. Já diz o velho ditado: “mais vale prevenir do que remediar”. Vamos, então, falar sobre o elefante na sala.

A doença oncológica, conhecida por cancro, é um dos maiores desafios globais de saúde pública em todo o mundo. Dados da International Agency for Research on Cancer indicam que o número de novos casos de cancro é cada vez maior, prevendo-se que uma em cada cinco pessoas poderá desenvolver alguma doença oncológica.

Quais são os tipos de cancro mais comuns?

Na Europa, os tipos de cancro mais comuns são:
Nas mulheres: cancro da mama, cancro colorretal e cancro do pulmão;
Nos homens: cancro da próstata, cancro do pulmão e cancro colorretal.

Sabia que, em cada 10 casos de cancro, 3 a 5 poderiam ser evitados com a adoção de um estilo de vida saudável? Isto é, evitando o tabaco, mantendo um peso corporal adequado, moderando a ingestão de bebidas alcoólicas, integrando a prática de atividade física no dia a dia e tendo uma alimentação saudável e equilibrada, tal como preconizado na dieta mediterrânica.

Ainda que o cancro seja uma doença sem uma causa específica ou única, a nutrição é uma aliada fundamental, tanto na prevenção como no complemento do tratamento das mais variadas doenças oncológicas – e está ao alcance de todas as pessoas.

Só há um problema: existe a tendência para se olhar com mais atenção para a alimentação quando já é tarde demais, ou seja, depois de existir um diagnóstico.

Alimentação e cancro

Na demanda por uma alimentação completa e saudável, podem surgir dúvidas sobre qual o melhor caminho a seguir, sobretudo quando diariamente somos bombardeados com alimentos ou “dietas da moda” que prometem mundos e fundos.

O Dia Mundial Contra o Cancro celebra-se anualmente a 4 de fevereiro. O objetivo é aumentar a consciencialização relativamente à doença oncológica, assinalando a importância da sua prevenção, deteção precoce e tratamento.

No contexto da relação entre cancro e alimentação, a dieta mediterrânica – considerada o padrão alimentar mais saudável do mundo pelo 8.º ano consecutivo pela U.S. News & World Report – é apontada como uma opção. Vale a pena referir que os sintomas das doenças oncológicas e os respetivos tratamentos podem variar de pessoa para pessoa, pelo que é muito importante procurar informação credível junto dos profissionais de saúde.

Os benefícios da dieta mediterrânica no cancro

O perfil anti-inflamatório e antioxidante da dieta mediterrânica faz dela uma aliada na prevenção de doenças oncológicas, uma vez que privilegia o consumo de hortofrutícolas (frutas e vegetais), cereais integrais, leguminosas (como o grão, feijão e ervilhas), frutos oleaginosos (mais conhecidos por frutos secos) e a utilização de azeite como gordura de eleição. Apela também a um consumo ocasional de carnes vermelhas, produtos processados e refinados, e um consumo moderado de produtos lácteos e peixe.

Sabia que?

Num estudo de 2020 efetuado a 1000 pessoas residentes em Portugal, foi possível averiguar que apenas 26% apresentavam uma elevada adesão à dieta mediterrânica. Na sua maioria, o consumo de leguminosas, hortícolas, fruta e frutos oleaginosos era inferior ao recomendado.

Dicas de alimentação durante o tratamento oncológico

No decorrer da doença oncológica, as necessidades nutricionais e a tolerância aos alimentos podem alterar-se, pelo que ajustar a alimentação é fundamental, tendo por base, sempre que possível, os princípios da dieta mediterrânica. Existem alimentos com características capazes de amenizar possíveis efeitos secundários dos tratamentos de quimioterapia e radioterapia. Partilhamos algumas dicas.

Água aromatizada com laranja, limão, hortelã e canela, em copo de vidro.

Em caso de alterações do paladar e olfato:

  • Utilize ervas aromáticas, especiarias, limão e marinadas;
  • Aromatize a água com hortelã, canela ou casca de laranja;
  • Prefira alimentos frios (ou à temperatura ambiente) e cítricos;
  • Ingira alimentos com sabores e texturas contrastantes (misturar carne ou peixe com frutas, alimentos doces com salgados, incluir alimentos crocantes ou sementes nas receitas, são alguns exemplos).
Tigela de sopa de legumes decorada com folhas de manjericão e sementes.

Em caso de boca seca, aftas ou outros:

  • Opte por alimentos líquidos, moles ou em puré (por exemplo, creme de legumes, batidos, ovos mexidos ou gelatinas);
  • Tenha sempre uma garrafa de água por perto;
  • Evite alimentos ácidos (como tomate, vinagre, limão, laranja, abacaxi…), salgados ou muito condimentados (com malagueta, piripiri, pickles…), alimentos ásperos ou demasiado duros (vegetais crus, tostas, batatas fritas, frutos secos);
  • Evite alimentos/bebidas muito quentes.
Peito de frango grelhado sobre uma tábua de madeira, decorado com ervas frescas.

Em caso de diarreia:

  • Prefira alimentos cozidos em água ou a vapor, grelhados e assados sem molho;
  • Opte por frutas como banana, maçã ou pera cozida (sem casca);
  • Mantenha a hidratação, bebendo 1,5 a 2 litros de água por dia;
  • Evite leguminosas e vegetais crus (consuma preferencialmente cenoura, abóbora, curgete sem casca ou nabo, cozidos);
  • Escolha cereais com menos fibra, como pão branco, bolachas de água e sal, arroz branco e massa não integral;
  • Evite o consumo de lactose, café e bebidas alcoólicas.
Tigela com bolachas de água e sal caseiras.

Em caso de náuseas e vómitos:

  • Faça refeições mais ligeiras e mais fracionadas ao longo do dia;
  • Evite alimentos condimentados e com molhos, especiarias intensas (caril ou pimenta) e picantes, fritos, demasiado doces ou salgados e com odor intenso;
  • Prefira confeções mais simples, como grelhados, cozidos ou assados sem molho;
  • Consuma preferencialmente alimentos e bebidas frias ou à temperatura ambiente;
  • Prefira alimentos secos (pão, cereais simples, torradas, bolachas de água e sal, tortilhas de arroz/milho…) e frescos, como fruta, gelatinas ou gelados à base de gelo;
  • Evite beber muitos líquidos às refeições.
Aveia adormecida com chia, mirtilos e maçãs, servida em taça de vidro.

Em caso de obstipação:

  • Consuma alimentos ricos em fibra, como fruta, vegetais de folha verde, cereais integrais, sementes, frutos oleaginosos e leguminosas;
  • Beba água ao longo do dia (1,5 a 2 litros);
  • Sempre que possível pratique atividade física (caso tolere e não seja contraindicado pelo médico), uma vez que estimula os movimentos intestinais.
Ovos cozidos acompanhados de fatias de pão torrado, servidos num prato.

Em caso de perda de apetite e perda de peso:

  • Enriqueça as sopas com carne, peixe, ovos ou leguminosas;
  • Opte por alimentos com maior teor calórico, como azeite, frutos secos, manteiga de frutos secos ou abacate;
  • Faça várias refeições, de menores volumes, ao longo do dia;
  • Tenha sempre alimentos prontos a consumir ao dispor (exemplo, ovos cozidos, iogurtes proteicos, tostas…);
  • Inicie a refeição pelo prato principal, deixando a sopa para depois.

Dica

O livro Receitas e Conselhos para Doentes Oncológicos, lançado pelo Pingo Doce e pela CUF, reúne dicas de alimentação e recomendações de saúde, acompanhadas de 100 receitas que poderão contribuir para amenizar os efeitos secundários dos tratamentos oncológicos.

Quem enfrenta uma doença oncológica precisa de se manter bem nutrido, de forma a evitar a perda de peso e/ou de massa muscular e a melhorar a tolerância aos efeitos secundários dos tratamentos. O acompanhamento nutricional deve ser personalizado, de acordo com o diagnóstico tratamento em curso, tendo também em conta fatores como as preferências alimentares de cada pessoa e a sua autonomia. Para quem quer cuidar da sua saúde e prevenir um diagnóstico, há muitos aspetos do estilo de vida que devem ser analisados e, se necessário, adaptados – o prato pode ser um ótimo ponto de partida.


Este artigo foi desenvolvido em conjunto com a equipa de Nutrição do Grupo Jerónimo Martins. Informe-se junto do seu profissional de saúde.